“Educação virou um negócio rentável no Brasil”

Terra – 01/08/2014 –  Por: Fabrício Bernarde
 
10 perguntas para Martin Hall, reitor da Universidade de Salford
O arqueólogo Martin Hall, reitor da Universidade de Salford, instituição britânica de ensino com mais de 20 mil alunos, diz estar extasiado com o Brasil de 2014. “Estive aqui há 15 anos e é incrível como o País cresceu”, diz Hall. O acadêmico esteve em São Paulo, na semana passada, para anunciar que a Salford vai abrir um escritório na capital paulista. Hall também está surpreso com a rentabilidade do mercado de educação no Brasil e citou o gigantismo do grupo Kroton. “Parece que a educação virou um negócio”, diz.Por que é tão importante para a Salford se internacionalizar?
A qualidade acadêmica de uma universidade é diretamente proporcional ao seu grau de internacionalização. Estudantes de fora trazem novas ideias, maneiras diferentes de enxergar o mundo e, principalmente, outras realidades. Isso tudo, no longo prazo, torna meus alunos mais criativos e maduros. Criatividade é muito importante para a Salford, pois temos uma escola de comunicação e outra de design e planejamento urbano. Internacionalização é ótimo para networking também.

Pode dar um exemplo de como isso acontece?
Se um empresário brasileiro, que já estudou em Salford, decide abrir uma unidade do seu negócio na Europa, para onde ele vai? Para a Inglaterra. Ele já viveu lá, conhece o mercado e tem amigos ingleses.

O que o sr. acha do mercado de educação no Brasil?
A Salford é considerada uma universidade grande na Inglaterra, e temos 25 mil alunos. O Grupo Kroton tem 1,5 milhão de estudantes. Educação virou um negócio rentável no Brasil. Não vejo problema algum em ganhar dinheiro com esse mercado, contanto que o lucro seja reinvestido na qualidade do ensino. E, pelo visto, muitas universidades brasileiras não fazem isso.

Como resolver esse problema?
Com intervenção do governo. É seu papel fiscalizar e garantir a qualidade dessas universidades. Afinal, educação me parece algo estratégico para o Brasil.

Vocês passam por situação análoga no Reino Unido?
Em geral, a fiscalização lá é mais rígida. O governo é bastante rigoroso em relação à qualidade do ensino.

Mas a situação mudou com David Cameron como primeiro-ministro.
Sim. Principalmente em relação a bolsas de estudo. O Reino Unido nunca foi um exemplo de bem-estar social na Europa. Mas, antes, com Tony Blair no poder, as bolsas para os alunos britânicos terem acesso ao ensino superior eram mais abundantes.

Isso prejudicou a Salford?
Não muito. A maioria das bolsas era para universidades mais tradicionais, como Oxford e Cambridge, que, ao contrário das federais brasileiras, não são gratuitas.

Como competir com essas universidades?
Focando no mercado de trabalho. O papel da Salford é ser uma ponte entre o mundo acadêmico e a experiência no mundo corporativo. Acho incrível o fato de muitos brasileiros de 20 e poucos anos estarem imersos no mercado de trabalho, no qual querem atuar tão cedo. Na Europa, normalmente, o estágio é só depois da faculdade, não durante.

Por que abrir um escritório no Brasil?
O Brasil cresceu muito rapidamente. É o país-referência da América Latina. Vocês estão se queixando de crescer 1% ao ano. Na Europa, isso é motivo de comemoração. Além disso, os brasileiros são criativos e extremamente comunicativos. Quantos prêmios de publicidade internacionais vocês já ganharam? O escritório vai servir para negociar mais parcerias com universidades locais.

Precisa estar aqui presencialmente para fazer isso?
Sem dúvida. A cultura do Brasil é muito diferente da Inglaterra. Educação é um “slow business” (negócio lento). Não posso sair fazendo parcerias sem um conhecimento local. As universidades parceiras têm de ter o mesmo nível de qualidade do que a Salford.

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