SILVIA GASPARIAN COLELLO – Folha de São Paulo – 23/11/2012 – São Paulo, SP
As iniciativas de avaliação escolar parecem legítimas pela possibilidade de subsidiar um balanço sobre o trabalho desenvolvido, o que permite vislumbrar fragilidades no processo de ensino e aprendizagem, rever o projeto pedagógico e estabelecer prioridades para o replanejamento da vida escolar.
Este é o objetivo assumido pelo Enem: situar a escola perante o contexto nacional, para que se possa reconfigurar metas e perspectivas de trabalho em nome do aprimoramento do ensino.
Tomados como um indicador de qualidade, os dados favorecem a transparência entre escola e comunidade.
Se a intenção avaliativa é a princípio louvável, os usos que se fazem dos resultados do Enem pelo ranking das escolas podem, entretanto, comprometer seus propósitos, prestando um desserviço à sociedade.
Isso porque, na prática, o Enem acaba funcionando como um critério único e reducionista de avaliação, que não faz justiça à complexidade dos fatores envolvidos no processo educacional.
Por um lado, é injusto comparar escolas com diferentes realidades e perfis de alunos; por outro, parece insuficiente que todo o esforço da escola seja avaliado por uma única prova de conhecimento.
Admitir isso seria reforçar a tendência de uma educação centrada nos saberes e habilidades cognitivos, em detrimento de aspectos pouco mensuráveis, como a formação de valores.
Além disso, como o uso do Enem se presta ao sistema de propaganda das escolas particulares, o ranqueamento gera uma competição descabida no mercado educacional.
Uma busca que acaba por inverter o sentido da avaliação, já que o Enem deixa de ser o balanço do processo pedagógico e passa a reger o próprio funcionamento das escolas, muitas delas movidas pelo treinamento para o exame.
No limite, o Enem é até motivo para a criação de `escolas-vitrine`, com alunos selecionados para garantir o cobiçado e lucrativo topo da lista.
Quando os fins justificam os meios, o projeto de formação humana de cada escola corre o risco de perder a identidade, porque torna-se refém da própria avaliação. Uma educação elitista na contramão dos princípios democráticos.