Folha Dirigida – Educação
“É mais fácil as professoras de educação infantil sentarem em rodinhas, brincando e cantando do que nas séries mais avançadas. Com o tempo, o excesso de conteúdos que o docente precisa aplicar ao longo do ano faz com que a carga sobre os alunos seja cada vez maior. Com isso, o tempo das brincadeiras precisa ser diminuído e as aulas viram, de um modo geral, algo chato, muitas vezes uma espécie de decoreba”, explicou.
De acordo com a professora Paty Fonte, especialista em pedagogia de projetos e educação infantil, com as crianças há muitas atividades de contação de histórias, artes e músicas, entre outras coisas, o que não acontece com os mais velhos. Para a especialista, os educadores precisam variar as práticas de ensino dentro de sala, estabelecer laços afetivos e levar em consideração que cada um aprende de um jeito.
“O famoso cuspe e giz, fala e escrita, não interessa mais, porque o aluno não vê sentido na matéria. Precisamos trazer o mundo real para dentro da escola, trabalhar mais as pesquisas, soluções para problemas daquele bairro e atividades que despertem um algo a mais. Ainda se pensa em decoreba, ainda se pauta o ensino de uma forma tradicional demais. Hoje, com tanta informação, os estudantes chegam ávidos por novidades e cheios de coisas na cabeça, às vezes, só precisam de uma orientação provocar uma reflexão”, disse, lembrando que mesmo no ensino médio é necessário encontrar formas de diversificar as atividades na escola. “Tudo é questão de planejamento e organização, de acordo com a comunidade a qual está inserido. Por exemplo, um jovem do 3º ano do ensino médio pode ter um médico na família. Essa pessoa pode fazer uma palestra, falar algo sobre sexualidade, drogas, saúde, prevenção de doenças, etc”, completou a educadora, autora do livro Projetos Pedagógicos Dinâmicos, que saiu pela WAK Editora.
Formação dos professores ainda precisa evoluir
Segundo Cíntia Borher, o ensino prazeroso pode ser implementado em qualquer faixa etária. O problema é que os próprios professores também foram educados da maneira tradicional de pensar e fazer as coisas e, de certa forma, acabam repetindo o mesmo modelo, quando na verdade a educação deveria acompanhar as transformações que ocorreram no mundo.
“Ainda existe uma falha na formação docente, pois é tudo muito teórico. O professor têm todos os recursos na mão e deve partir dele a postura de transformar os conteúdos em algo mais reflexivo e menos imposto. Temos a mania de achar que somos os donos da verdade. Precisamos parar para ouvir o que os alunos têm a dizer, pois muitas vezes vêm com respostas e argumentos que nós, adultos com formação acadêmica, ainda não tínhamos pensado”, disse a educadora, ressaltando que o prazer não deve estar apenas em quem aprende, mas também em quem ensina. “O professor também têm preguiça de ler, também não se interessa em ler jornais, em saber o que acontece no mundo. Ainda não foram todos que se deram conta que a sua prática dentro de sala pode determinar o que aqueles alunos farão no futuro. É uma influência muito grande e poucos já tomaram consciência disso”, lamentou.
Uma boa opção para tornar a escola mais atraente é a aproximação com os familiares. Estabelecer uma via de mão dupla, com interesse de ambas as partes, e participar ativamente da educação das crianças e adolescentes pode tornar o ambiente mais agradável e, com isso, criar laços afetivos mais fortes. Desta forma, o envolvimento dos pais pode contribuir para um ensino mais atrativo, segundo Paty Fontes. Apesar de toda correria que envolve a rotina de trabalho de muitos pais, a educadora acredita que é possível estabelecer essa interação.
“A escola deve tentar levar a família até ela, mas a família precisa querer participar também. Os pais têm um papel fundamental, porque as crianças não chegam vazias, elas já levam alguns hábitos e experiências. Podem chamar a vovó para contar histórias, ensinar receitas de bolo, o pai marceneiro para ajudar a construir objetos simples, a mãe cabeleireira, etc. Os alunos adoram, principalmente os menores”, garantiu.
Opinião:
Por que é difícil fazer o aluno ter prazer em estudar hoje em dia?
“De uma certa forma, o professor ainda não conseguiu entender que os alunos precisam de modificações. Todo engendramento de disciplinas, conteúdos e da própria escola, de um modo geral, precisa ser transformado. Isso não depende apenas do docente, mas de todo o amparo do sistema educacional, para favorecer educador a querer ensinar e o aluno aprender, ou seja, despertar o prazer no ensino. Alguns já despertaram para isso. Vejo que correm atrás por si mesmo, mas ainda existem aqueles que precisam descobrir a essência do fazer por desejo, através de uma formação mais pessoal, que é o que falta. Felizmente, muitas universidades já se preocupam com essa mudança na formação dos profissionais do magistério.”
Fátima Alves, mestre em Ciências da Saúde e do Ambiente, psicomotricista e fonoaudióloga
“O que falta é motivação e vontade. Precisamos de pessoas que estejam entusiasmadas, tanto para aprender quanto para ensinar. Isso é a paixão por educar. A minha começou aos 12 anos, quando dei aula particular para um menino da minha rua, que tinha 8 anos. Eu estava nas séries finais do fundamental e ele nas iniciais. Na minha opinião, o professor precisa ter a capacidade de contagiar os alunos, despertar neles a vontade de aprender para que queiram voltar no dia seguinte. O que falta é transmitir o conhecimento através de uma linguagem que entendam, de uma forma lúdica, divertida, que aguce a curiosidade. Dessa forma, nunca esquecerão o que aprenderam.”
Selma Inês Campbell, escritora e professora de Língua Portuguesa e Educação Infantil
“Conteúdo não significa dar um upgrade de potencial de inteligência, seja qual for a idade. O que importa é a qualidade do estímulo. Humano ama aprender, o que não gosta é de conteúdos enfadonhos, que a escola se vê obrigada a dar dentro de um programa ao longo do ano letivo. O professor não tem culpa, na verdade, tem uma série de conteúdos que precisam ser cumpridos, mas o processo de elaboração do aprendizado e do significado, muitas vezes, passa batido. E aí, é aquela história de estudar, decorar, passar de ano e esquecer, sem deixar nada para a construção da vida. A educação fast food pensa no que tem pronto agora para dar, não na educação do processo de construção do saber.”
Marta Pires Relvas, professora, psicopedagoga e neurobióloga
“No processo educacional, o prazer em estudar está muito ligado ao de descobrir. Quando o aluno vai à escola para não descobrir nada, acha chato e prefere ficar em casa. Se eu estivesse na posição do estudante, em uma situação como esta, eu também preferiria. O acesso à informação é muito fácil. Já temos tanta coisa pronta e a escola dá mais ainda, quando o grande barato é ensinar como se constrói, exatamente para o aluno pegar as informações e refletir pensar em como aquilo se encaixa em determinado contexto. Uma aula de Física para passar no vestibular, é chata. Agora, se ensinarmos que podem ir além, é lógico que os alunos terão interesse. Precisamos mostrar uma realidade aplicável, não só para fazer prova.”
Joaquim de Paula, professor de música e Matemática
“Trabalhei muito tempo em educação básica e, na minha visão, a escola precisa se reinventar, pois há um conflito de gerações. Os professores são formados da mesma maneira há 20 anos, enquanto os alunos têm um conhecimento de mundo bem avançado. Enquanto isso permanecer, os alunos continuarão confrontando a escola com o conhecimento que levam para dentro dela e a escola continuará tentando enfiar conteúdos goela abaixo. Como mudar? Investindo em formação multidisciplinar dos professores, o que não significa misturar disciplinas diferentes, mas sim com outros pensamentos e formas de ver o mundo para discutir como a educação pode avançar. Quando a mente dos educadores se abrir para esse mundo, começaremos a mudar.
José Ricardo Cereja, pesquisador e professor de Engenharia de Produção na UniRio