Folha de São Paulo – REINALDO CHAVES COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Programa de ensino a distância exige dedicação diária do estudante
No Brasil, um em cada cinco alunos que se matriculam em cursos a distância não chega ao fim do programa.
Segundo o censo 2012 da Abed (Associação Brasileira de Educação a Distância), os programas autorizados pelo MEC têm evasão média de 20,5% e os livres de 23,6%. O Ministério da Educação não mede a evasão nos cursos superiores presenciais, mas a USP (Universidade de São Paulo), por exemplo, tem uma evasão média de 20%.
Apesar de oferecer benefícios como estudar em casa, a um ritmo próprio, a educação a distância (EAD) tem uma evasão similar ou maior que a do ensino presencial.
Isso acontece porque essa modalidade de estudo exige muita dedicação -a aparência de facilidade é falsa, já que o aluno tem que aprender por conta própria.
O estudante precisa ter disciplina diária se quiser concluir o curso, e as escolas devem ter uma estrutura de tutores para ajudá-lo.
A produtora de eventos Aline Queiroz Souza Farinelli, 36, desistiu ano passado de um curso de graduação de marketing após cursar apenas um bimestre. Ela tem dois filhos e sofreu para conciliar o trabalho doméstico com os estudos.
“É complicado organizar tudo em casa para ter um tempo só para estudar. É preciso deixar tudo certo para não haver imprevistos na agenda”, conta. “No meu caso, a própria escola atrapalhava. Era uma turma com mais de 400 pessoas, então tínhamos pouco suporte dos professores.”
Ela voltou ao mesmo curso a distância neste ano, mas em outra instituição. Diz ter encontrado uma turma menor e mais facilidade para conversar com os docentes.
A questão da organização também passou por ajustes. Ela costuma chegar em casa por volta das 20h, cuida das tarefas domésticas e começa a estudar às 22h -só para depois de três horas de leitura.
Essa é a rotina nos dias úteis. Aos sábados e domingos, a dedicação ao aprendizado varia e Farinelli se dedica mais a assistir a vídeos e a fazer exercícios.
O diretor da Abed, Carlos Longo, considera que essa modalidade de ensino só é flexível em duas características: o tempo (a pessoa pode estudar menos ou mais horas em cada dia) e o local (a tecnologia permite estudar em casa, no trabalho ou mesmo no trânsito).
“No resto, não há concessões: o aluno de educação a distância tem que estudar mais, pois não tem professores e colegas à disposição para trocar ideias. Isso só pode ser feito por e-mail ou fóruns, nem sempre com resposta automática”, diz Longo.
Zilma Carvalho, coordenadora do Senac, afirma que o aluno precisa ter características como autodisciplina, proatividade para ler e pesquisar sozinho e ter um objetivo claro, como um novo emprego ou uma promoção.
“Quem estudar só uma vez por semana fracassará. Cerca de duas horas por dia é o necessário para acompanhar as leituras e fazer os exercícios no prazo”, orienta.
“O aluno precisa fazer uma agenda dos seus compromissos pessoais, de trabalho e de estudo, para ter prioridades.”
SEM BANHO
Para Daniel Landi, 29, gerente administrativo de uma rede de concessionárias, o ensino on-line se encaixou bem ao seu estilo de vida. Ele foi piloto da Stock Car e cursava uma graduação presencial de administração. Por causa dos treinos, acabou sendo reprovado por faltas.
Já fora das pistas e em sua nova carreira, ele continuou sem uma agenda adequada para frequentar uma faculdade convencional. Optou por um curso a distância de gestão financeira, em que resta estudar só quatro disciplinas para encerrar a graduação.
Para se adaptar ao modelo, Landi busca ambientes silenciosos e isolados e criou um compromisso consigo mesmo.
“Não dá para chegar em casa, tomar um banho, descansar e só depois estudar. Para mim, só funciona se eu agir como se estivesse em uma escola física, sem dispersões”, afirma.
De acordo com especialistas, é importante que o aspirante a esse tipo de curso verifique se a instituição de ensino oferece o serviço de tutores, que verificam o desenvolvimento do aluno.
“Nós temos uma marcação muito cerrada do estudante. Se ele deixa de realizar as atividades por mais de uma semana, o tutor da turma entra em contato por telefone para entender o porquê”, conta o diretor da FGV Online, Stavros Xanthopoylos.
Também é importante verificar se o aluno se encaixa na metodologia da escola virtual: os cursos costumam incluir, por exemplo, apostilas virtuais e aulas por vídeo.
David Forli Inocente, coordenador de desenvolvimento do programa MBA Gestão Estratégica da USP, realizado a distancia, diz que, ao selecionar os candidatos, a instituição verifica se eles têm perfil para estudarem sozinhos.
“No processo seletivo, que tem quatro fases e dura quase dois meses, temos prova de lógica e interpretação de texto, estudo de caso, entrevista e análise de currículo”, conta Inocente.
“Tudo isso é feito porque temos muita atenção em perceber o compromisso do candidato com sua carreira e quanto ele compreendeu da metodologia.”