A Conferência da Isme tem como objetivo justamente valorizar esse conteúdo, garantido por lei mas longe de ser uma realidade nas escolas brasileiras. A coordenadora-geral do evento, Liane Hentschke, justifica que o encontro deveria ser uma espécie de apoteose para celebrar o ensino da música no país, mas se transformou num desafio para a internacionalização do Brasil nesse departamento. Processo que, segundo ela, será longo e difícil. Um exemplo disso é que sequer há estatísticas sobre a presença de professores de música nas salas de aula do país.
– Não tem mapeamento, não está no radar das autoridades. O descaso pode ser medido pela dificuldade de realizar a Conferência. A secretaria municipal de Educação ofereceu 20 cadeiras e três microfones. A secretaria estadual alegou que não tinha dinheiro e o banco do Estado (Banrisul) preferiu patrocinar a festa do porco numa cidade do interior. Todo mundo achou ótima (a Conferência), mas ajudar, pouca gente ajudou – reclama a professora.
Em Porto Alegre, segundo dados da Secretaria de Educação, há 50 professores de música concursados para as 97 escolas municipais, incluindo educação infantil, ensino fundamental e ensino médio. A defasagem é flagrante, embora a capital gaúcha esteja entra as cidades brasileiras com mais densidade no ensino da música. Liane lamenta que a lei de 2008, “como tantas outras”, não tenha virado realidade. Segundo a professora, o problema é que falta avaliação sobre a medida. A lei, por exemplo, não determina carga horária, conteúdo mínimo, formação dos docentes e nem eventuais punições para escolas que não adotarem a disciplina. Em países com mais tradição musical, o ensino da disciplina é apoiado por uma base curricular objetiva, material de didático bem produzido e estrutura nas escolas, que oferecem instrumentos para seus alunos durante toda a formação.
– O resultado é que muitos estudantes que concluem o ensino médio nesses países tocam melhor que nossos estudantes de graduação – lamenta Liane.
Na Escola Municipal da Vila Floresta a estrutura não é a ideal mas, mesmo assim, o ensino de música resiste. A professora Cristina foi incorporada à rede no início deste ano. As aulas de piano são ministradas em um teclado cedido pela própria professora. A “bateria” foi construída pelas crianças usando latas e embalagens plásticas recicladas. Foram elas também que ajudar a montar um cantinho para as apresentações, com microfones de brinquedo e instrumentos de plástico para exercitar o gosto pelo palco. A vice-diretora da unidade, Cláudia Parra Stein, conta que o saldo é positivo.
– É importante manter a constância da oferta de ensino musical, independentemente da estrutura. De uma forma ou de outra, aqui eles têm contato com o universo da música e podem evoluir junto com a escola. As famílias, infelizmente, ainda não têm tradição de presentear um violino ou uma harpa para seus filhos, em vez de um videogame – constata.
A Isme foi criada em 1953 pela Unesco e atualmente existe em mais de 80 países, com 300 mil sócios. A Conferência da instituição se realiza a cada dois anos. Em Porto Alegre serão cinco dias de conferências, workshops e simpósios voltados para educadores, professores e estudantes de música, além da apresentação de 36 grupos musicais de vários países.
Segundo a presidente da Isme, Margaret Barret, o evento oferecerá uma oportunidade para celebrar a diversidade da criação mundial.
– As autoridades educacionais precisam reconhecer as múltiplas formas que a música molda nossas vidas e refletir sobre as contribuições únicas que traz à vida dos indivíduos e das comunidades – diz.