BOLETIM NO. 16
A ABRALE, o desafio e a responsabilidade
A diretoria que ora assume a ABRALE dispôs-se a aceitar o que consideramos um desafio, após um período de impasse, no qual múltiplas sensações de natureza diversa mesclaram-se a um balanço das conquistas de nossa entidade e à constatação de que havia uma necessidade premente de fazê-la alçar um patamar mais elevado de representatividade dos autores.
Um misto de cansaço e desânimo manifestou-se na fala de diversos companheiros que têm se dedicado à nossa associação, tendo em vista as dificuldades que têm permeado esse trabalho. Para que uma instituição como a nossa se desenvolva – ela é relativamente jovem, foi fundada em 1992, é necessário que um grupo de pessoas não só se dê conta da importância da associação como forma de representatividade do interesse coletivo de todos os autores, mas também que enfrente questões desgastantes, como: compatibilizar poucos recursos humanos e materiais com a precariedade de tempo que todos sentem. Nesse período de existência da ABRALE, contando ainda com um número pequeno de associados e menor ainda de participantes ativos, algumas questões, como a avaliação de livros didáticos realizada pelo MEC, têm exigido de todos os autores um posicionamento em torno de interesses e princípios, o que pode explicar um certo descontentamento por parte daqueles que, em momentos mais críticos, não se sentiram suficientemente respaldados pela entidade. Porém, é preciso lembrar que isso talvez não ocorresse, caso o número de filiados fosse maior e que, portanto, o debate de idéias e a busca de alternativas para o encaminhamento das questões ganhassem contornos mais expressivos, além de viabilizar que atingíssemos níveis mais competentes de comunicação com a sociedade que, por exemplo, tende a aceitar sem maiores reservas as avaliações coordenadas por profissionais vinculados a universidades bem conceituadas. É bom lembrar que, em parte graças à forma que a mídia usualmente divulga esses fatos, a maior parte das pessoas acaba por concluir, de forma errônea, que determinada universidade como instituição – e não um de seus docentes em particular – é responsável por tal avaliação, o que imprime maior credibilidade a julgamentos desfavoráveis a uma determinada obra*.
Apesar dessas dificuldades, a ABRALE é hoje uma entidade consolidada, responsável por viabilizar alguns documentos importantes para todos nós, como é o caso do Código de Ética – apesar de bastante recente, já se revelou útil como instrumento na defesa de dois de nossos associados, diante de um caso de plágio -, como também pela assessoria jurídica prestada a seus associados, entre outras ações que poderíamos relembrar e que foram mencionadas por diversos autores presentes nesses momentos em que tentávamos decidir sobre os rumos a tomar.
A nós que assumimos a Diretoria da ABRALE parece claro que é fundamental tentar engajar o maior número possível de autores na entidade para, juntos, buscarmos defender muitos pontos importantes para todos nós. Entre eles, podemos citar:
1. Ampliação dos canais de comunicação entre os autores e os da ABRALE com a sociedade, de modo a dar maior visibilidade às nossas idéias, contribuindo para que nossa dignidade como profissionais seja respeitada. Entre os recursos importantes, cabe destacar a continuidade do projeto do site da ABRALE, implantado na gestão anterior. Ele é um recurso fundamental para, entre muitos outros aspectos, agilizar as trocas de informações a respeito de assuntos de nosso interesse.
2. Participar de forma ativa, junto com a ABDR (Associação Brasileira de Direitos Reprográficos), na luta pela garantia dos limites legais quanto ao uso das reproduções de nossas obras, bem como na luta pelo recolhimento dos direitos autorais referentes a essas cópias.
3. Estabelecer, com a Assessoria Jurídica, um conjunto básico de cláusulas que devem constar de todos os contratos que os autores assinem com as editoras.
4. A partir da coleta de informações junto aos associados, verificar como as editoras têm mantido os autores informados a respeito de suas obras – por exemplo, número de livros em estoque, quantidade de livros usados na divulgação da obra, relatórios de venda e assim por diante. Negociar junto à Abrelivros – entidade representativa dos editores de livros didáticos – um conjunto de normas que garantam um mínimo de qualidade e de periodicidade dessa comunicação entre editora e autor.
5. Organizar eventos que congreguem os autores em torno do debate e do estudo de temas de interesse educacional, em particular daqueles que têm assumido maior relevância para todos aqueles que, como nós, se dedicam à produção de material didático.
6. Em relação ao processo de avaliação dos livros, prosseguir na luta para torná-la mais justa e equilibrada, de modo a garantir que o espaço de defesa de cada autor a críticas e julgamentos improcedentes.
Esperamos poder contar com os colegas autores para que participem de nossa entidade e que colaborem na campanha por mais associados. De nossa parte, desejamos ampliar nossa comunicação com todos por meio do site (www.abrale.com.br) e, especialmente, contando com uma participação crescente de todos os nossos autores nas assembléias, oportunidade única para o debate de idéia, o que poderá ampliar nossos horizontes institucionais.
* Maiores esclarecimentos constam do texto “A ABRALE e a avaliação de livros didáticos”. Vera Novais
A ABRALE e a avaliação de livros didáticos
Desde 1995 a ABRALE vem acompanhando e tomando posições sobre a avaliação do livro didático promovida pela Secretaria do Ensino Fundamental do MEC.
No início, nossa posição foi de apoio e colaboração em relação à avaliação, considerando-a um instrumento para melhora do livro didático, objetivo não só do MEC, mas de todos os educadores, entre os quais os autores se incluem.
Em documento enviado ao MEC em 14/06/95, a ABRALE consubstanciava sua colaboração, tomando como princípios a pluralidade de tendências e enfoques pedagógicos, a liberdade do professor na escolha do texto didático e o compromisso dos autores com a melhoria da educação brasileira. Nesse documento, a ABRALE apresentou grande número de propostas, dentre as quais destacamos:
1. a inclusão nas comissões de avaliação de professores do ensino fundamental e médio;
2. o diálogo de mão dupla entre autores e avaliadores, em especial o direito dos autores avaliados se contraporem à crítica dos avaliadores;
3. divulgação da crítica transparente e ampla, mas avessa a sensacionalismos e generalizações enganosas;
4. produção de um “guia do livro didático” e de um manual de uso do livro pelo MEC;
5. incentivo à elaboração de livros que contivessem manual do professor;
6. promoção por parte do INEP/MEC de pesquisas e de simpósios periódicos sobre o livro didático;
7. aquisição apenas de obras que contivessem o selo da ABDR;
8. compra pelo governo apenas de obras que tivessem contratos regulares de edição e autores responsáveis;
9. medidas de ordem administrativa por parte do MEC que aumentassem a credibilidade do processo de compra e entrega do livro didático na escola.
É inegável que muitas das propostas foram incorporadas ao processo de avaliação e compra dos livros didáticos, evidenciando a relevância de nossa contribuição. No entanto, as propostas 1, 2 e 6, de caráter mais claramente democrático, e a proposta 3, que protegeria os autores de deslizes éticos, nunca foram consideradas seriamente pelo MEC, demonstrando seu interesse em manter controle absoluto do processo e, talvez até, no caso da proposta 3, de adquirir instrumentos de pressão. É certo que chegou a haver concordância de setores do MEC em relação ao direito de defesa dos autores frente à avaliação, mas isso foi logo esquecido.
No documento dirigido ao MEC em 19/05/96, a ABRALE já criticava essas omissões, bem como se colocava contra a intenção do ministério de atribuir “estrelas” (de uma a três) às obras avaliadas. O motivo mais imediato decorria do fato de que o professor seria induzido a escolher obras unicamente pela qualificação (redutora) em termos de estrelas, recebendo livros que, não se adaptando a seu perfil pedagógico, prejudicariam seu trabalho.
Essas críticas da ABRALE foram ignoradas. As avaliações prosseguiram e, na opinião de muitos autores, vieram repletas de erros e sectarismos. Mesmo aqueles com visão favorável do processo admitiam a alta probabilidade de injustiça, tendo em vista sua realização centralizada, com o MEC assumindo funções de promotor e juiz das obras, sem existir a figura do advogado de defesa.
Por essas razões, em 23/10/98 e 29/11/99, a maioria dos presentes em assembléias gerais decidiu repudiar a avaliação promovida por órgãos estatais, propondo em seu lugar uma avaliação plural, conduzida por instituições públicas, tais como universidades e associações científicas e educacionais.
Sem dúvida, a decisão teve repercussão em esferas do MEC, tanto que foi divulgado em relação a esta última avaliação tornada pública em abril de 2001, que sua realização esteve a cargo de universidades tais como USP, UFPE, etc. Infelizmente, trata-se de meia verdade. Embora os coordenadores do processo em cada área pertençam aos corpos docentes dessas instituições, a realização não é de responsabilidade de universidade alguma. Ademais, a proposta da ABRALE de uma avaliação plural não se cumpre quando uma única equipe avalia os livros em cada área, permanecendo o veredito único.
Continuamos prisioneiros de um julgamento que, por ser restrito, deve conter erros e injustiças e, por ser irrecorrível, fere direitos elementares dos cidadãos de um país que se pretende democrático. Os autores bem sucedidos do momento não deveriam estar tranqüilos. Os que são prestigiados hoje podem ter suas obras excluídas num próximo ciclo, se forem novos os avaliadores e inesperados os critérios. Perdem-se, assim, anos de trabalho, sem direito a defesa alguma.
Faz-se necessário, portanto, maior união de autores em torno da ABRALE para discutir amplamente esse processo, propor alternativas e encontrar formas de pressão para que nossos direitos elementares não sejam desrespeitados. A ABRALE, embora seja uma associação consolidada, que sempre se manteve presente no processo de avaliação, é, por outro lado, uma instituição pequena, sem presença na mídia, com limitada participação dos sócios. Esse quadro precisa mudar para nos aproximarmos de nossos objetivos, que não só melhorariam a avaliação, como também teriam reflexos positivos no panorama educacional do país.
Um primeiro passo em busca de um novo caminho para a ABRALE é a assembléia que estamos convocando para 14/05/2001, na qual contamos com sua participação, seja associado ou não. A Diretoria
O que a ABRALE tem a oferecer?
ABRALE e avaliação do livro didático
Você sabia que desde 1995 a ABRALE acompanha o processo de avaliação do livro didático e deu a ele contribuições significativas?
Apesar disso, o processo todo ainda se mostra vulnerável a erros e injustiças e a possíveis críticas sectárias dos avaliadores, o que fere direitos democráticos dos autores e pode prejudicar seriamente seu prestígio.
A ABRALE luta por uma avaliação mais equilibrada e pelo direito de manifestação do autor diante de julgamentos inadequados. É um objetivo importante para todos nós, mas, para atingi-lo, é preciso mais participação dos associados.
ABRALE e aprimoramento pessoal
Na gestão da diretoria anterior, a ABRALE reuniu a equipe que elaborou os Parâmetros Curriculares do Ensino Médio, seus associados e diversos professores. Neste ano de 2001, a ABRALE prevê a realização de um simpósio do livro didático.
Encontros desse tipo representam foros de discussão e troca de idéias que contribuem para aprimorar o trabalho de cada autor.
ABRALE e a proteção dos direitos de autoria
Em 1996 a ABRALE promoveu um encontro dos autores com o deputado José Genoíno, na época relator da Lei dos Direitos Autorais, que acabou sendo promulgada.
Desde sua fundação, a ABRALE é membro da Associação Brasileira de Direitos Reprográficos, com a qual procura contribuir na tarefa de coibir a reprodução xerográfica de obras impressas. Esse esforço em defesa dos direitos autorais vem tendo gradativo sucesso, com decisões judiciais favoráveis a editores e autores e condenação à pirataria.
A ABRALE tem um Conselho de Ética. No ano passado, autores associados à ABRALE denunciaram um caso de plágio e a intervenção do Conselho contribuiu para levar a questão a bom termo.
Atualmente, por força da globalização, várias editoras nacionais se integram a conglomerados multinacionais, tornando as relações autor-editora mais técnicas, regidas por contratos estritos, ao contrário do passado recente quando a simples amizade podia determinar a relação. Nessas condições, o autor pode necessitar de orientação e a ABRALE oferece Assessoria Jurídica.
O conjunto desses exemplos mostra que a ABRALE defende os direitos de autoria.
Portanto…
Como você viu pelos exemplos, da ABRALE você não pode esperar prêmios (uma viagem, por exemplo!) ou segurança (assistência médica!). Mesmo assim, é inegável que ela contribui para o exercício profissional do autor e para a educação do país. Tudo isso vale a pena, não é?
Repare que a ação da ABRALE se reforça a cada autor que ingressa na associação e participa dela. Se você ainda não faz parte, que tal se associar?
A Diretoria
E a globalização chega no livro
Foi-se o tempo em que os textos escolares eram apenas veiculados em papel impresso e as editoras brasileiras eram empresas familiares.
Nesse tempo, não havia o computador, os cd-roms, a internet e as máquinas copiadoras. Era bem menos difícil para o autor de textos controlar os direitos morais e patrimoniais gerados pela obra que criara.
Ainda nesse tempo, era muito comum que o autor tivesse contato direto com o proprietário da casa editora. Muitas vezes o convite para escrever partia do próprio empresário. Algumas editoras eram até conhecidas pelo nome do seu fundador. Falava-se: a Cia. Editora Nacional do Dr. Tales, a Editora do Brasil do Dr. Carlos Costa, a Editora Ática do Prof. Anderson, a Editora Moderna do Prof. Feltre, a Editora Atual dos Profs. Osvaldo e Gelson, a Editora Scipione do Prof.Scipione etc.Seria coincidência que alguns desses editores fossem pessoas ligadas à Educação?
Mesmo nessa época, a relação autor/editora estava longe de ser igualitária. O autor querer discutir os termos de um contrato de edição ou desejar informações sobre o desempenho comercial da sua obra eram vistos por alguns editores mais autoritários como “desconfiança”, quase uma ofensa.
O país cresceu. Acompanhando o vertiginoso crescimento da população estudantil, as editoras de livros escolares cresceram e diversificaram seus produtos. A força de trabalho necessária para criar novos textos também teve de crescer. Surgiram centenas de novos autores. Paralelamente, o desenvolvimento dos computadores pessoais e da informática tornou possível a concretização da idéia antiga de se ter uma relação interativa – via cd-roms – no ensino-aprendizagem. O advento da internet possibilita a veiculação de informações e de programas educativos. As máquinas copiadoras alcançaram uma quantidade e capacidade de produção inimaginável há 25 anos e são utilizadas para reproduzir muitas vezes obras inteiras, sem que os direitos de criação sejam contemplados.
Nesse contexto complexo, um importante fato novo está acontecendo: as editoras pequenas foram sendo compradas pelas grandes e, mais recentemente, grandes editoras acabam de ser compradas por enormes empresas transnacionais. É a chamada “globalização” que chega no livro escolar.
Como os autores de livros educativos farão agora para:
· defender seus direitos de criação perante as grandes corporações editoriais que vêm aí?
· resguardar seus direitos no caso de veiculação de sua obra via cd-roms ou via internet?
· combater a pirataria descarada das lojas copiadoras?
Sem dúvida, a defesa dos direitos do autor começa pela assinatura de um contrato de edição justo, moderno, aprovado por uma assessoria jurídica especializada.
Seria oportuno que a diretoria da ABRALE colocasse entre suas metas prioritárias a montagem de uma assessoria jurídica gratuita a todos os associados que o desejarem.
Gelson Iezzi