Necessidade de trabalhar e dificuldade de conciliar emprego e estudos são as principais causas da alta evasão da modalidade; bolsas são alternativa para reduzir problema
Dificuldade de conciliar estudo e trabalho, de pagar as mensalidades, as longas distâncias entre a escola, a residência e o local de trabalho, falta de base teórica, insatisfação com o curso, falta de conhecimento sobre a área escolhida e até a possibilidade de ingressar no ensino superior motivam a evasão nos cursos técnicos e profissionalizantes.
Segundo especialistas, a taxa é alta, apesar de não existirem dados oficiais no Brasil. Além disso, uma das características dessa modalidade é possuir várias opções de percurso escolar, o que dificulta os estudos sobre evasão. Mas combater suas causas é crucial para o sucesso desses cursos, sobretudo num momento em que o país passa por uma rápida expansão desse tipo de formação – incentivado pelo governo federal por meio do Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec).
Almério Melquíades de Araújo, coordenador da área de Ensino Técnico, Desenvolvimento Econômico, Ciência e Tecnologia do Centro Paula Souza, que administra as Escolas Técnicas estaduais de São Paulo (Etecs), não minimiza a existência da evasão no Ensino Técnico, mas ressalta que é preciso analisar com cuidado essas taxas. “Esses cursos, em sua maioria, têm certificações intermediárias. Se considerarmos que todo aluno que começou um curso precisa terminá-lo até o último módulo, teremos um índice de evasão bastante alto”, diz.
Rosemary Dore, professora da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), lembra que há várias possibilidades que levam ao trancamento da matrícula, além do abandono, e nem todas configuram evasão. O estudante pode mudar de curso; ou permanecer no mesmo curso e mudar apenas a modalidade (integrado, subsequente ou concomitante) ou a rede de ensino na qual estuda; interromper o técnico para ingressar no ensino superior; obter certificação do ensino médio pelo Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) ou mesmo abandonar definitivamente a formação profissional.
Modalidades
Há três modalidades de cursos técnicos de nível secundário, que visam à rápida inserção dos formandos no mercado de trabalho. No “integrado”, o currículo reúne os conhecimentos do ensino médio e as competências da educação profissional, ou seja, o aluno tem uma única matrícula para obter os dois diplomas. No “concomitante”, o aluno se matricula em dois cursos distintos: no técnico e no ensino médio, o que pode ser feito em uma mesma escola ou em instituições diferentes. A terceira modalidade é a “subsequente” e o aluno que se matricula nesse curso já concluiu a Educação Básica e procura apenas a formação técnica.
O número total de matrículas na educação profissional, de acordo com o Censo da Educação Básica 2012, é de 1.362.200, sendo que um mesmo aluno pode ter mais de uma matrícula. Destas, 823.429 são matrículas na modalidade subsequente; 298.545, no ensino médio integrado; e 240.226 no ensino técnico concomitante.
Para Araújo, a taxa de evasão, ao menos nas Etecs, varia de acordo com a modalidade de ensino adotada. No ensino técnico integrado ao ensino médio a demanda por vagas é alta e a taxa de evasão é baixa. “O aluno costuma ser adolescente ainda, muitas vezes pressionado pela família, que não permite que ele pare de estudar para trabalhar sem concluir o ensino médio”, explica. Nas modalidades concomitante e subsequente, a evasão é mais frequente por vários motivos: “o principal deles é a pressa em conseguir um emprego. O aluno faz metade do curso, consegue uma certificação intermediária e vai trabalhar, abandonando-o”.
Rosemary, que coordena uma pesquisa sobre a rede federal de educação profissional e tecnológica de Minas Gerais, fez um levantamento sobre as razões que levaram esses alunos a abandonar seus cursos entre 2006 e 2010 (veja quadro). “Nossos resultados mostram que os motivos mais presentes no abandono escolar da escola técnica de nível médio não se referem ao ”desinteresse pela escola”, mas, principalmente, a questões socioeconômicas, como dificuldade de conciliar estudo e trabalho e necessidade de trabalhar.”
Redução da evasão
As medidas de combate à evasão adotadas pelo Instituto Federal do Paraná (IFPR) parecem confirmar o que o estudo feito por Rosemary aponta. O IFPR criou programas de assistência estudantil, por meio dos quais repassa aos estudantes benefícios financeiros nas formas de bolsa de inclusão social ou auxílios moradia, transporte e alimentação.
Um deles é o Programa de Bolsas Acadêmicas de Inclusão Social (PBIS), que concede bolsas mensais no valor de R$ 350 para os alunos dos cursos técnicos e superiores. Os interessados são selecionados após uma análise do perfil socioeconômico, que leva em conta aspectos como a renda familiar per capita. Os estudantes podem ainda se candidatar ao Programa de Assistência Complementar ao Estudante (Pace), que financia despesas com alimentação (R$ 100), transporte municipal e intermunicipal (R$ 100 e R$ 150) e moradia (R$ 200). Em 2012, o índice de conclusão do ano letivo dos estudantes que receberam benefícios como o PBIS e o Pace foi de 93%.
Além dos programas de assistência estudantil, a instituição busca reduzir a evasão por meio do controle de frequência e do acompanhamento pedagógico dos estudantes. O trabalho é realizado diretamente por equipes pedagógicas dos campi, que acompanham as ocorrências de evasão.
Ainda que a questão econômica tenha um peso forte, ela não é o único motivo da evasão. Há uma série de medidas a serem tomadas pelas escolas para que seus alunos não abandonem seus cursos antes de concluí-los. Segundo Araújo, preparar materiais didáticos adequados é uma delas. “O aluno fala que não tem base para acompanhar o curso e isso é um problema dele e da escola. Os professores precisam estar preparados para lidar com esse público.”
O coordenador do Centro Paula Souza ressalta ainda que a escola precisa investir em laboratórios e em equipamentos para que o curso tenha um forte viés prático, já que uma das reclamações dos alunos é que os cursos são muito teóricos. Além disso, muitos alunos já trabalham na área do curso e trazem conhecimentos que precisam ser reconhecidos e considerados. “A escola tem de avaliar estas competências e dispensar das aulas para que ele faça o curso mais rapidamente”, defende Araújo.
Para Rosemary, não existem programas de acompanhamento do aluno dentro das instituições que, para além da questão financeira, ofereçam suporte didático, pedagógico e emocional. Ela conta que, em muitos lugares, os professores sequer sabem os nomes dos alunos de seu curso e, assim, não podem identificar estudantes prestes a abandonar a escola. “Como a evasão é um processo, existem diferentes sinais enviados pelos alunos de que eles estão em ”situação de risco” e que precisam ser captados. Identificar esse aluno é um trabalho difícil, mas muito menos complexo do que o de trazer o aluno de volta para a escola, depois que já a abandonou.”
Pronatec amplia oferta de cursos técnicos gratuitos |
Com a meta de expandir e interiorizar a oferta de cursos de educação profissional e tecnológica, o governo federal criou, em 2011, o Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec). O objetivo é criar 5,5 milhões de vagas em cursos de qualificação profissional e 2,5 milhões em cursos técnicos até o final de 2014.A Bolsa Formação do Pronatec é ofertada pela rede federal, pelas redes de 16 estados e pelos Serviços Nacionais de Aprendizagem – SNAs (Senai, Senac, Senat e Senar). Os cursos de qualificação profissional têm se concentrado nos SNAs, ao passo que os cursos técnicos têm tido maior oferta pelas redes estaduais e federal.
A partir de 2013, o Ministério da Educação expandirá a oferta de cursos técnicos subsequentes gratuitos, por meio de instituições privadas de ensino, a exemplo do que vem ocorrendo no ensino superior com o Programa Universidade para Todos (ProUni). EAD Apesar de a modalidade estar em plena expansão, educadores divergem sobre a capacidade de o ensino a distância reduzir as taxas de evasão no ensino técnico. Para Almério Melquíades de Araújo, do Centro Paula Souza, de São Paulo, a EAD ainda precisa vencer algumas resistências e preconceitos, mas é uma boa alternativa. Segundo ele, as escolas precisam aprender a dar cursos técnicos profissionalizantes a distância porque a demanda, apesar de ainda não ser tão alta quanto no ensino presencial, tem crescido. As Etecs paulistas já oferecem três cursos técnicos em EAD para cerca de 5 mil alunos. Já para Rosemary Dore, professora da UFMG, a EAD ainda é uma área muito complexa de pesquisa. Segundo ela, em geral, os cursos a distância apresentam altas taxas de evasão, como mostram o Censo da Associação Brasileira de Educação a Distância (Abed, 2010) e o Anuário Estatístico de Educação Aberta e a Distância (2008). “Assim, esse tipo de educação não tem contribuído para diminuir o problema da evasão”, diz. |