Nova Escola – Com reportagem de Rodrigo Ratier
Na sociedade do século 21, a aprendizagem se torna cada vez mais colaborativa, aberta e permanente. É preciso se lançar na aventura de compreender esse novo mundo para ensinar as competências que ele requer
A cultura digital veio para ficar. De tão repetida, a afirmação perde força. Banalizada, pode dar a impressão de que se trata de apenas mais uma entre tantas mudanças que constituem o que se convencionou chamar de fluxo histórico. Sim, é uma mudança. Mas é das grandes. Gente da envergadura do filósofo Pierre Lévy conferem a ela o status de revolução. A quarta revolução da comunicação humana, para ser mais preciso (as três primeiras seriam a invenção da escrita, do alfabeto e da imprensa).
O momento é revolucionário porque, pela primeira vez, toda a memória da humanidade está reunida virtualmente, todos os elementos dessa memória podem ser interconectados e acessados de qualquer lugar. Não somos espectadores passivos desse processo. Ao contrário: a cada “curtir” no Facebook, a cada post num blog, a cada link recomendado no Twitter transformamos o ambiente digital e nos comunicamos com todos que participam da rede. Somos todos leitores, autores, editores, curadores, documentalistas e bibliotecários. “Esse é o ambiente a partir do qual a nova civilização vai se construir”, afirma Levy. “Devemos preparar nossas crianças para viver nesse contexto.”
Como ninguém ensina o que não conhece, é importante abrir-se a esse mundo e entender sua lógica de funcionamento. Há boas notícias no front. O número de professores que declaram ter dificuldades em atividades com o uso de ferramentas multimídia vem diminuindo, como revela a edição de 2011 da Pesquisa TIC Educação: 35% relataram problemas em 2011 ante 44% em 2010.
O fato de que os alunos possuem mais conhecimento técnico (ao menos num primeiro momento, já que a maioria dos professores não são nativos digitais) não deve assustar. A análise crítica do potencial e dos limites da cultura digital cabe ao professor. Ao desenvolver a familiariadade com esse universo, ele inicia a capacitação para a reflexão.
A motivação individual é um motor, mas uma ação consistente e ampla exige investimentos governamentais na formação continuada – na base de nove dólares para cada dólar gasto em tecnologia, segundo cálculos do professor da Universidade de Stanford Paulo Blikstein.
Nesse terreno, o horizonte é menos promissor. Como regra, falta continuidade, capilaridade (e, não raro, coerência) nas iniciativas de aproximação da escola com a tecnologia. Outras tantas vezes, cai-se na armadilha do fetiche – um objeto ao qual se atribuem poderes mágicos ou sobrenaturais – e a ideia de dotar a escola de tablets, wi-fi e lousas digitais passa a ser encarada como a solução do problema.
Obviamente, não é. Não se pode perder de vista que o essencial é ajudar o aluno a se posicionar na era digital. Pierre Levy defende que, no mar de informações da rede, é preciso auxiliá-lo a definir prioridades; a filtrar e a selecionar fontes confiáveis; a sintetizar os argumentos escolhidos; a construir um discurso autoral, que dialogue com outras referências sem ser mero recorte-e-cole; a compartilhar sua produção; e a reavaliar, à luz dos comentários da comunidade virtual, o que produziu.
São essas as competências cada vez mais necessárias para o mundo do trabalho e para a vida social. Ferramentas novas, porém fundamentais para sobreviver a este momento de grande transformação cultural. Transformação que, para Pierre Lévy, está apenas no início, e cujos efeitos ainda não podemos dimensionar.