Fundação Vanzolini recebe do governo Serra R$ 46 milhões em dois contratos sem licitação
Informativo Adusp No. 281, 11 de maio de 2009
Quem informa é o Diário Oficial do Estado de 15/11/2008, p. 21: para prestar à Secretaria de Estado da Educação (SEE) “serviços especializados de gestão integrada, desenvolvimento, produção e logística necessária à elaboração do material pedagógico complementar da proposta curricular da 5ª a 8ª séries do Ensino Fundamental e do Ensino Médio”, vinculados ao Projeto Proposta Curricular do Estado de São Paulo/São Paulo Faz Escola, a Fundação Vanzolini recebeu nada menos do que R$ 31,487 milhões.
Entre tais “serviços especializados” figurava a edição e produção de um livro de geografia para a sexta série. Após a sua publicação, constatou-se que trazia erros grosseiros nos mapas da América do Sul. Foi preciso recolher meio milhão de exemplares (Informativo Adusp 279). Estudantes e professores apontaram erros crassos em livros de outras disciplinas, como História e Filosofia.
A fundação privada, dita de apoio ao Departamento de Engenharia de Produção da Escola Politécnica, foi contratada sem licitação. O despacho que dispensa a Vanzolini de licitação foi assinado pela então secretária da Educação, Maria Helena Guimarães de Castro, em 14/11/08, segundo o D.O.E. de 15/11: “Diante do que consta dos autos, com fundamento no artigo 26, da Lei Federal 8.666/93 c.c. o mesmo artigo da Lei Estadual 6.544/89, ratifico a declaração de dispensa de licitação, a favor da Fundação Carlos Alberto Vanzolini, objetivando a contratação de serviços especializados (…) no valor total de R$ 31.487.418,00”.
Em outro contrato firmado com a SEE, de nº 007/2007, a fundação recebeu mais R$ 15,241 milhões (D.O.E. de 27/6/2007, p. 23), para “prestação de serviços nas ações de gestão do projeto de elaboração do material de apoio pedagógico ‘Percursos de Aprendizagem’, com dispensa de licitação, nos termos do inciso XIII, do artigo 24 da Lei Federal n° 8.666/93”.
Este contrato recebeu pelo menos dois aditivos em 2008. Em julho, a Coordenadoria de Estudos e Normas Pedagógicas da SEE autorizou o Termo Aditivo nº 2, “bem como a despesa no valor mensal de R$ 3.755.900,50 (…), para o exercício de 2008”, com vigência “de 03/07/2007 a 25/10/2008” (D.O.E. de 30/7/08, p. 35).
Repercussão
O fato de a Fundação Vanzolini haver declarado à Folha de S. Paulo que o livro de geografia “foi produzido por professores indicados pela Secretaria” provocou o seguinte comentário do professor Helder Garmes, da FFLCH: “Eles dizem que o mapa com dois Paraguais foi feito por técnicos indicados pela Secretaria da Educação. Quem é que manda nisso então?” A pergunta é bastante pertinente: se a elaboração dos mapas coube a técnicos indicados pela própria Secretaria, como justificar a contratação da fundação, ainda por cima sem licitação?
“A reportagem do Informativo Adusp que pergunta se a Fundação Vanzolini é expert em geografia acabou mostrando que a FV não é expert nem em geografia nem em editoração”, comentou a professora Maria Otília Bochini, do Departamento de Jornalismo e Editoração da ECA, onde leciona a disciplina “Edição de Livros Didáticos e Paradidáticos”.
Como a Fundação Vanzolini, no entender da professora, “não é desse ramo de negócios, precisou chamar seus serviços de editoração de ‘gestão integrada, desenvolvimento, produção e logística necessários à elaboração do material pedagógico’ etc., sem nada de específico para edição”.
Ainda segundo Maria Otília, diante da explicação da fundação de que a incorreção nos mapas teria sido “involuntariamente gerada no processo de diagramação e aplicação dos nomes de alguns países”, fica evidente que o trabalho do diagramador foi diretamente para a gráfica, sem passar por uma revisão. “O problema não é o erro, é a falta de revisão”, comenta. “A falta de revisão antes de mandar imprimir revela despreparo e desconhecimento da Fundação Vanzolini.”
Maria Otília lembra que, no caso específico de geografia, as grandes editoras de livros didáticos dispõem de profissionais especializados na confecção e revisão de mapas. “A resposta da Fundação Vanzolini apenas expôs seu desconhecimento de rotinas básicas da boa editoração e passou, assim, a si mesma, atestado de incompetência para esse tipo de prestação de serviços”.