Por meio do aprendizado e do ensino colaborativo, empreendedores viabilizam cursos baratos, diversificados e sob medida
Transformar o aprendizado numa dinâmica descomplicada, barata e agregadora é o desafio de qualquer indivíduo que dedique parte de seu tempo a pensar no tema educação. Um novo conceito de ação colaborativa está próximo de integrar essas três características e criar a ‘escola dos sonhos’ de qualquer um. Trata-se do crowdlearning (ou aprendizado colaborativo). Sem dispor de um método definido, o conceito de aprender graças à colaboração de quem deseja ensinar, a um preço acessível, tem feito alguns jovens conseguirem a autonomia que sempre quiseram ter na sala de aula – e nunca puderam: escolher cursos presenciais de assuntos que lhe interessem e distribuí-los em sua agenda na medida que lhes apetecer. Esqueça o modelo à distância. A ideia do crowdlearning é também estimular a interação entre “estudantes” num mesmo espaço físico.
A dinâmica é simples: um indivíduo que deseje compartilhar qualquer tipo de conhecimento – técnico ou não – deve se cadastrar em uma das iniciativas de crowdlearning disponíveis no país – que não são muitas, aliás. Às empresas que detêm os espaços de aprendizado cabe a tarefa de servir como ponte entre o “professor” e aqueles que desejam aprender. A internet, no caso, é o meio mais dinâmico para divulgar os cursos. As empresas não se responsabilizam pelo conteúdo – apenas funcionam como ‘curadoras’. Os alunos em potencial, por sua vez, acessam os sites das iniciativas, escolhem os treinamentos e cotizam-se para financiar o encontro. Atualmente, há quatro centros em atividade no Brasil: The Hop e Cinese, em São Paulo, Nós.Vc, em Florianópolis, e A Grande Escola, em Curitiba.
Ainda que as sedes estejam em capitais, como os centros de crowdlearning são organizados e pensados na rede, os cursos e encontros podem ser realizados em outros municípios. Mesmo que com algumas variáveis entre si, as iniciativas têm em comum a colaboração, tanto no aprendizado quanto no ensino, além de terem sido criadas por jovens, a maioria entre 20 e 30 anos, com mentes ávidas por aprender. “Eu e meus amigos sempre promovíamos alguns encontros fora da faculdade, por acharmos que muitas de nossas aulas eram fracas”, afirma o catarinense Leonardo Correa da Cunha Oliveira, um dos fundadores da Nós.Vc.
Público mínimo – A iniciativa levada adiante por Oliveira e seus colegas do curso de Design da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) foi inspirada em ações de crowdfunding, formato de financiamento coletivo de projetos feito pela internet. O Catarse é a principal rede dessa modalidade de financiamento de projetos no Brasil e serviu como modelo para os catarinenses.
Como não se trata de trabalho voluntário, para que os cursos sejam concretizados é preciso que haja uma adesão mínima de participantes. No caso do Nós.Vc, uma plataforma da empresa na internet permite que cada participante interessado em ensinar use a base do site para reunir alunos em potenciam que possam viabilizar financeiramente as aulas. “Isso dá segurança para quem está organizando um curso, um encontro. O risco é zero”, explica Oliveira. O site nasceu em agosto do ano passado e, desde então, já promoveu 221 encontros.
Preço baixo – Como os cursos e workshops são de curta duração, muitas vezes resumidos a apenas um treinamento, os valores cobrados são baixos – e até gratuitos, se o ‘professor’ assim desejar. Os preços podem variar de 10 a 300 reais, mas a maior parte dos cursos custa entre 50 e 100 reais. Para manter seus custos, as empresas que promovem as iniciativas ficam com um porcentual do valor cobrado. No caso da Nós.Vc, a comissão é de 7,5%.
O Cinese, em São Paulo, tem algumas opções de cursos gratuitos, mas quando são pagos, sua comissão chega a 20% – os pagamentos são feitos por meio eletrônico. O Cinese foi criado em agosto do ano passado e já promoveu 196 encontros. A empresa é administrada por cinco jovens que dividem as tarefas de comunicação, desenvolvimento do site, departamento financeiro, gestão e desenvolvimento gráfico.
Se, por um lado a ideia de fazer cursos livres, a baixo custo e promovidos por “qualquer um” parece um sonho, Anna Haddad, do Cinese, explica que algumas pessoas ainda têm barreiras para aceitar esse tipo de aprendizado. “Tem gente que deixa de fazer porque nós não emitimos certificados”, explica. Ela diz que, especialmente no caso de alunos cujos cursos podem ser financiados por suas empresas, a informalidade do currículo é um impeditivo.
Integração – Se o currículo informal espanta alguns, atrai outros, como o carioca Rafael Nepô, de 27 anos. Com a bagagem técnica de TI e o conhecimento de design, ele elaborou um workshop para facilitar a vida das pessoas que trabalham com computadores da marca Apple. A ideia do curso era fazer com que os participantes fossem mais produtivos usando os computadores da empresa de Steve Jobs. “Queria ensinar algumas coisas diferentes do que se costuma ensinar, como atalhos e outras dicas para os que querem usar melhor as máquinas Apple”, explica. “O foco dos meus workshops é dar uma entrada para um determinado universo.”
No primeiro final de semana de agosto, Nepô vai promover o seu terceiro workshop. O título é tão descontraído quanto o próprio ambiente do Cinese: “Morra Photoshop – editando com o Lightroom”, voltado para o aprendizado de software de edição de imagens. O jovem ficou tão próximo do Cinese que acabou entrando para o grupo e hoje cuida da parte visual da empresa.
Os temas dos treinamentos são os mais variados e vão desde finanças pessoais a edição de livros, passando por como organizar uma festa “de arromba”. Este último foi um dos cursos promovidos por Guilherme Krauss, de 26 anos, um dos fundadores do centro A Grande Escola. “A adesão foi tão boa que decidimos que todos os aniversários de nossa empresa serão comemorados, todos os anos, com as festas organizadas pelos alunos desse curso”, conta Krauss, que também é um dos fundadores.
Fora do Brasil – A ideia da A Grande Escola foi inspirada na School of Life, iniciativa de um grupo de filósofos em Londres – e que já possui, inclusive, uma filial no Brasil. A proposta é ensinar “coisas que você precisa aprender, mas ninguém te ensina”, como uma aula de paquera, realizada em julho numa casa noturna de Curitiba. Krauss não revela o faturamento da empresa, mas explica que o negócio já se sustenta sozinho.
Nos Estados Unidos, uma das principais plataformas é o Skillshare, que nasceu em 2011, em Nova York. Um participante notório dessa iniciativa é Avi Flombaum, de 28 anos, que era chefe de tecnologia de sua própria startup, mas abandonou a empresa para se dedicar aos cursos de programação que ministra na Skillshare. Quando deixou para trás seu negócio, Flombaum acabara de faturar nada menos que 100 000 dólares em um ano.