Fonte: Gazeta do Povo (PR) – 15 de outubro de 2014
Nas últimas décadas, esses profissionais passaram de transmissores de conhecimentos a formadores de cidadãos e mediadores da informação
Todo mundo tem pelo menos uma lembrança com eles e não é para menos: durante anos, acompanham o crescimento e desenvolvimento de crianças que chegam cada vez mais cedo às salas de aula, puxam orelhas (figurativamente) quando necessário e marcam estrelinhas nos cadernos quando merecido. À medida que crianças tornam-se adolescentes, são eles que superam, dia após dia, as oscilações de humor e de disposição e orientam os primeiros pensamentos desses jovens questionadores sobre o futuro além-escola.
Embora essa típica construção social sobre quem é o professor perdure, a profissão passou por uma grande reconfiguração nos últimos 40 anos, muito em decorrência de uma mudança no entendimento sobre o que é educação. Nas salas de aula, o professor passou de transmissor de conhecimentos para formador de cidadãos e mediador de informações.
“Até meados do século 20 a escola no Brasil foi muito tradicional. A educação era centrada no que o professor transmitia para o aluno. Depois, passamos por um período de descoberta das tecnologias da educação. Só no início do século 21 é que se passou a falar em aprender – até então se falava em ensinar. Mas não adianta ensinar se o aluno não aprende”, explica Verônica Branco, doutora em Educação pela Universidade Federal do Paraná (UFPR) e professora no setor de Educação da instituição.
Mudou, também, o trato com o aluno. Hoje, o ensinar passa pela compreensão por parte do professor de quem é o aluno a quem ensina e quais experiências sociais ele possui. “Essa é a grande virada: considerar as vivências daquele sujeito e como ele aprende, para provocar a necessidade de aprender. A forma como se ensina tem que levar em consideração quem é cada aluno”, observa Verônica.
Professora na Escola Municipal Wenceslau Braz, Mariana de Oliveira Tozato, 31 anos e 10 de magistério, integra essa primeira geração de professores cuja formação foi baseada nas novas concepções pedagógicas, que situam o professor em um contexto de ensino bastante heterogêneo.
“O processo de educação envolve o contexto cultural, familiar e socioeconômico da criança. Se o professor elaborar um plano de aula sem conhecer a realidade do aluno, ele fica desconectado, quando na verdade precisa criar um vínculo forte com quem vai ensiná-lo.”
Jornal faz a diferença na escola
Ao perceber uma demanda educacional não suprida, Ilze Cristina Sollner de Brito Correa, 36 anos, 20 deles dedicados ao magistério, não se fez de rogada: buscou formação especializada e passou a trabalhar com alunos surdos na Escola Municipal Ulisses Guimarães, em Campina Grande do Sul. No projeto idealizado por ela no Ler e Pensar, a professora estimula a leitura das principais notícias do dia, para que seus alunos aprimorem a compreensão do dia a dia. “Surdos têm mais dificuldade em apreender a informação completa, entendem muitas coisas fragmentadas”, explica.
Ciente de que quanto mais associada à realidade vivida mais interesse a aula desperta, Ilze tratou de verificar quais assuntos eram mais familiares aos alunos e decidiu vivenciar a informação jornalística na prática. Para isso, o grupo ultrapassou os muros da escola e foi conhecer um centro de reciclagem de perto; visitou um posto de saúde e entrevistou o diretor da unidade e desbravou um centro de referência em agroecologia. Na volta, elaboraram apresentações para os colegas e um jornalzinho.
Já Mariana Tozato, professora de Ciências na Escola Municipal Wenceslau Braz, usa as edições da Gazeta do Povo para trabalhar educação ambiental com os alunos. Fez leituras e discussões direcionadas de reportagens sobre meio ambiente. Tudo mudou com as chuvas de junho, que provocaram enchentes no Paraná. “Os alunos contavam que suas casas foram alagadas, falavam das roupas e brinquedos que perderam”, lembra. Defensora de práticas pedagógicas que contextualizem o conteúdo ensinado e o aproximem da realidade dos alunos, ela chamou pais e professores para um bate-papo sobre o assunto.