Fonte: O Globo (RJ) – 06 de janeiro de 2016
Em consulta pública, 9,8 milhões de alterações foram sugeridas
Diante de críticas contundentes, o Ministério da Educação já decidiu modificar o texto do novo currículo nacional da Educação básica, chamado oficialmente de Base Nacional Comum Curricular. O texto já recebeu cerca de 9,8 milhões de sugestões de alterações desde que entrou em consulta pública, em setembro de 2015.
História deverá ser a disciplina com mais mudanças. O MEC prevê que temas relacionados à História antiga ficarão mais presentes na nova versão da Base. Mas as falhas apontadas por especialistas no texto aberto à consulta pública não se resumem a História. Foram apontados também problemas graves em Português e Matemática.
No currículo de História, a principal falha do texto elaborado por uma comissão de Professores universitários, de acordo com estudiosos, é a ausência ou a pouca ênfase na História europeia, que inclui temas importantes como o estudo da Grécia e da Roma antiga, além das Revoluções Francesa e Industrial, contrapondo-se a um vasto conteúdo de História do Brasil e da África, assinalando a importância de determinados povos, como indígenas e escravos.
Historiadores veem viés ideológico
A configuração do conteúdo levou historiadores a apontarem um suposto viés ideológico de esquerda na Base Curricular. Hoje, a presidente da Associação Nacional dos Professores e Pesquisadores de História (Anpuh), Maria Helena Capelato, se reunirá com o MEC para pedir prazo maior para a consulta pública, que termina em 15 de março.
— Em alguns pontos, a proposta aparece muito detalhada, nas revoluções Cubana ou Mexicana, por exemplo. Em outros, como o Renascimento ou as Navegações, as menções são raras e vagas. É ótimo fazermos a crítica do eurocentrismo, mas não se pode deixar de fora aqueles que estão sendo criticados. Da mesma forma, concordamos com a inclusão de povos que são relegados no Ensino, como os índios, os Incas — afirma Maria Capelato.
O ministro interino da Educação, Luiz Cláudio Costa, refutou as acusações contra a Base. Segundo ele, o documento em consulta pública é uma primeira versão que ainda incluirá as contribuições que vêm sendo feitas. Em seguida, explicou Costa, o texto ainda passará pelo crivo das redes de Ensino estaduais e municipais, que farão seminários, até ser encaminhado ao Conselho Nacional de Educação. Só depois disso, o ministro Aloizio Mercadante (que está em férias) poderá assinar a Base para torná-la obrigatória.
— Não há qualquer chance de haver um viés ideológico na Base Nacional Comum. O importante é acreditar no processo de debate que vai melhorar a proposta inicial até se chegar ao consenso possível — afirma Costa.
Mercadante e o ex-ministro da Educação Renato Janine Ribeiro, responsável por apresentar a versão em debate do currículo nacional, em setembro, já defenderam a necessidade de alterações. Na época da divulgação, Janine disse que o documento elaborado pelos Professores convocados pelo MEC precisava ser melhorado. O então ministro usou termos como “brasilcêntrico” e “africocêntrico” para classificar o trabalho. Depois de assumir a pasta, Mercadante concordou com as críticas, em audiência pública na Câmara.
Denis Mizne, diretor-executivo da Fundação Lemann, que trabalha com projetos inovadores na área de Educação, disse achar natural a discussão sobre o tema, uma vez que o Brasil nunca teve um documento tão detalhado sobre o currículo da Educação básica:
— Sem entrar no mérito se temos de falar mais do escravo ou da Grécia, ficou claro que há uma real dificuldade de encontrar formas de ensinar História. Cabe à sociedade entrar no debate para fazer as modificações necessárias.
Paula Louzano, pós-doutoranda na Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo, lamenta que o debate sobre História ofusque problemas graves no currículo de Português e Matemática, considerados base do Ensino. A falta de rigor é uma das falhas, aponta Paula:
— No 1º ano, espera-se que o Aluno conte até 30. Em Cuba e em praticamente toda a Europa, é até cem; nos Estados Unidos, até 120. A gramática só aparece de forma explícita até o 3º ano, por causa da Alfabetização, depois desaparece.