Isto É – Camila Brandalise – 20/04/18
Mais da metade dos jovens brasileiros, de todas as classes sociais, perdeu o interesse pelos estudos e corre o risco de ficar fora do mercado de trabalho. Onde a nossa educação está falhando e qual o custo disso para o futuro do País?
A decisão de parar de estudar da auxiliar de limpeza Regina de Jesus Araújo, hoje com 24 anos, se deu por motivos econômicos. Há seis anos, quando ela morava com os pais, considerava ter uma estrutura de vida precária e preferiu se dedicar ao trabalho para conseguir se sustentar. Conciliar os estudos, na época, com 18 anos, não era viável. “Não tive incentivo nenhum para continuar na escola.” Hoje, mora sozinha e arca com as próprias contas. Para ter mais oportunidades profissionais, porém, percebeu que era preciso concluir a formação. E foi isso o que ela fez. Neste ano, cursa orgulhosa o primeiro ano do Ensino Médio em uma escola pública de São Paulo. “Quero ir para o ensino técnico. Gostaria de ser recepcionista porque gosto de trabalhar diretamente com as pessoas”, diz. É a tentativa de Regina para escapar de uma triste estatística, divulgada recentemente pelo Banco Mundial: 52% dos jovens brasileiros com idade entre 19 e 25 anos perderam o interesse pela escola e, por isso, correm o risco de ficar fora do mercado de trabalho. Parte dessa população simplesmente parou de estudar por necessidade financeira, como Regina havia feito, parte não consegue levar o colégio com o comprometimento que isso exige porque é obrigado a conciliar a atividade com trabalho informal e um terceiro grupo encontra-se atrasado em relação à série adequada à idade. Abandonar a escola para ajudar no sustento da família não é novidade. O que preocupa nos dados do relatório do Banco Mundial é que a falta de interesse pelos estudos avança para camadas sociais em que a necessidade de gerar renda não é a maior pressão. Um em cada três brasileiros de 19 anos está hoje fora da escola.
O documento aponta outro dado alarmante: a falta de participação dos jovens na construção da economia vinha diminuindo desde 2004, mas há quatro anos a tendência sofreu uma reversão. Isso ocorreu principalmente por causa do aumento de pessoas que não estão nem estudando nem trabalhando (os chamados “nem-nem”) e de jovens que estão desempregados ou em trabalhos informais. A justificativa imediata para o retrato tem a ver com o momento econômico atual do País, de crise financeira, desemprego e informalidade no trabalho. No entanto, há questões mais complexas por trás da situação. “A pergunta essencial que essa análise suscita para os formuladores de políticas é saber se, em condições econômicas menos favoráveis, é possível manter as conquistas anteriores em termos do engajamento juvenil. Esta é uma preocupação para um País cujo potencial de produtividade agora depende de forma tão crítica do engajamento de seus jovens”, diz o relatório.
Eixo estratégico
Há pelo País iniciativas que contemplam novos modelos. Sob a coordenação do Instituto Ayrton Senna, por exemplo, quinze escolas públicas de Santa Catarina adotaram mudanças importantes. “Estabelecemos um projeto de educação em tempo integral”, conta Ramos. Depois de um ano, a instituição comparou a taxa de abandono nesses colégios com as apresentadas por escolas do mesmo perfil socioeconômico. “O índice foi 50% menor”, informa o especialista.
“Não é preciso criar novas disciplinas, mas sim oferecermos outras maneiras de trabalhar em sala de aula”, afirma Ramos. Alterações mais profundas como essas são vistas em maior escala apenas em escolas particulares que se propõem a oferecer uma nova maneira de ensinar, com mais envolvimento dos alunos, atenção específica para dificuldades ou habilidades individuais e desenvolvimento de conhecimentos que vão além das disciplinas básicas. São instituições, porém, com mensalidades altas — as mais inovadoras chegam a custar R$ 8 mil por mês —, que obviamente não podem ser pagas pela maioria da população. Há, portanto, necessidade de revisão e implantação, por políticas governamentais, de iniciativas que contemplem as mudanças na rede pública. Isso inclui investimento em formação e valorização de professores. “Temos que focar em um projeto de País que coloque educação como eixo estratégico”, afirma Priscila Cruz, fundadora e presidente-executiva do movimento Todos Pela Educação. “Ou fazemos isso ou o Brasil perderá o bonde da história de novo.”
“O desenvolvimento do Brasil é o desenvolvimento dos seus cidadãos”, afirma a representante do Todos pela Educação.